2 de abr. de 2018

a casa ficou em silêncio

e é hora de pensar na morte do poeta e nos poetas todos que insistem em não morrer
pensar naquele silêncio de apartamento pequeno depois que luiz foi embora no silêncio depois que eu fui embora de mim tantas vezes tantas vezes que não seria possível agora contar

queimaram meu pai queimaram seu rosto e as cordas vocais de onde eu esperava que saíssem histórias saíssem amores saíssem louvores pela vida
mas não
e agora o silêncio grunhe o silêncio fala e entre gestos e olhares nos amamos

é hora de silêncio no coração de silêncio no nono andar o mar inteiro parece silenciar diante de um boleto a ser pago diante dum livro a ser escrito diante dum caminho a ser rodado
: para onde?

eu tenho trinta e três anos e ainda me apaixono por homens que elejo meus pais desde vinícius desde barone desde um professor bêbado no colégio interno
eu procuro

: alguém que fique em silêncio comigo e me diga
meu filho, a vida não é assim

a vida
não é
assim

quando talvez eu escute talvez eu aprenda talvez eu dê conta de não odiar as instituições a família a religião e os almoços de domingo em que se faz de conta que o amor é verdadeiro que o amor é permanente que o amor que o amor que nada.

tenho vergonha dos cigarros tantos porque sei que o que haveria por se preencher não será nunca possível

o poeta compreendeu
sandro compreendeu
e eu escrevi um poema para daniel, morto antes,
ele sim com uma vida inteira pela frente

ele sim com uma vida de torcedor do palmeiras
de financiamento de carro de emprego certo
de convicção política

[no lançamento de trapaça não apareceu um puto
dum familiar para me dar um abraço quando o que
se quer num momento desses é conforto: escrever
é um erro apostar nisso é um erro ser reconhecido
por isso errar tanto errar tanto!]

um poeta morreu

(mas)

eugênio agora tem um livro de que eu não consigo falar apesar de lhe ter escrito uma orelha
bruna foi quem desenhou a capa
o poeta que eu carrego como se fosse meu como se fosse um souvenir um algo que o valha

o poeta que não tem casa
que não tem família que não tem nada

mas um livro

(eu tenho cinco e nada disso
preenche o buraco nada disso
me deixa tranquilo)

é preciso chorar até a baba escorrer
pelo queixo pingar nos joelhos lamber
os tornozelos e assim alcançar o chão

rumar ao caminho da escada e alcançar
a rua porta afora

(isso não é um poema
é uma abstração
uma forma de chamar atenção
pro que não importa).

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