...encontrados no Caderno Azul.
#01
Ela me disse.
(Por que, afinal,
ela me disse?)
Uma dessas pessoas
de todos os dias,
tão pessoa,
ela me disse que
me invejava
a confiança, o desprezo,
a confiança que vem
do desprezo.
E por fim ela se disse
feliz por mim.
(Só na hora de dormir
eu finalmente entenderia).
#02
Fiquemos atentos a todo
e qualquer sussurro;
evitemos, em público,
todo e qualquer suspiro.
Sequemos os nossos olhos,
(Cuidado com todo brilho!),
Fujamos de todo abraço,
Fechemos todo sorriso!
Porque, quando menos se espera,
o que era pra ser, só era.
#03
O estouro e o estrago,
que venham.
E que se vá,
vez por todas,
toda e qualquer
canção
poema
bile
arma-de-fogo.
Emudeçamos!
(Para que nunca mais
homem algum
perca-se seguindo
um perfume de mulher).
#04
O saber da chuva, sentes?
Litros e litros de chuva
em milhares e milhares
de telhados.
Nós, deste lado da janela,
estáticos,
contemplativos.
Lembrando uma canção
triste ou um nome há
muito esquecido.
Chuva tanto mais chuva
- a melancolia dum mundo inteiro
que se encerra, ironicamente,
numa boca de bueiro.
#05
Céu de brigadeiro no interior.
Muito mais bonito!
O vôo de volta será
de trevas e tempestade,
mas aqui dentro.
Ela me disse:
- Amanhã o céu deverá
estar ainda mais azul!
#06
Buscar buscar buscar
Como se já não tivesse
encontrado.
Amar, sobretudo querer,
e permitir-se saber
ser amado.
20 de set. de 2010
9 de set. de 2010
Nove de setembro.
envelheçamos naturalmente, como há muito tem sido, sem nenhuma merda de remorso, afinal a fonte através da qual jorrava o leite derramado secou. aprendamos, finalmente, com o que nos acontece e com o que nos deixou de acontecer há séculos: acreditemos nas inverdades inglórias que aprendemos com o passar dos dias e que a continuação dos erros é puro divertimento, tapa na cara dos fatos, tapa na cara da sabedoria adquirida com os anos: aprendi? erro por gosto e ponto final.
afinal, ela me disse, quando eu disse estar ficando velho, quase trinta anos, ela me disse que ainda faltam quatro anos para os meus trinta, o grande marco - se eu chegar lá - mas ela me disse que falta muito e continuou perguntando aonde eu estava há quatro anos e a reticência que se seguiu em mim fechou a sentença a me dispunha cumprir: eu não me lembro, talvez não queira lembrar, ia tudo muito bem há quatro anos, como era tudo uma merda há quatro anos, exatamente como hoje também é; dessa forma, daqui a quatro anos, quem sabe: eu vivo hoje.
eu vivo hoje como programa de abstinência de viciadinho em narcóticos, mas eu vivo. vivi ontem e antes de ontem e tenho estado vivo há uma semana, mas a vontade de deixar de viver ou voltar a morrer em doses de um grama ainda me seduz de maneira tamanha! mas não falemos disso, hoje é meu aniversário. falemos de coisas boas.
meu presente de aniversário: viagem a porto alegre, rever a família, os irmãos que a
natureza jamais poderia me ter dado, mas que me deu o acaso, somos então e somos só e somos sós - mas por escolha! e eles me reviram e sorriram aquele sorriso de esperança ainda, quando eu digo que não há mais por onde e o que resta é dançar um tango argentino ou encarnar o junkie americanóide e morrer aos vinte e sete, mas os sorrisos, ah, os sorrisos me comovem e me demovem de toda autodestruição, porque não poderia deixar de tê-los, de vê-los sorrindo pra mim, por mim.
há quem não telefonará hoje. roni, charles, daniel e quantas pessoas que não fazem mais aniversário e nesse momento eu penso na crença dos que crêem e lamento não tê-la. penso revoltado que não poderei receber um telefonema ou um postal dos que não andam mais por aqui. simplesmente porque não existem mais. e porque céu não há, está claro.
a comoção de um cumprimento de meu pai, um aperto de mão que transformo em abraço e em beijo e em mais um abraço. gabriel que me dará um embrulho e pensará, criança que é, na injustiça de não receber ele um presente. o presente mais bonito: um abraço de criança.
se eu esperava sentado na calçada pelos que viriam, não espero. se há um ano escrevi o texto de aniversário que escrevi, era porque esperava. não espero mais. não espero mais nada. deixarei que os anos venham; eu sobrevivo. deixarei que os anos venham e tragam consigo tudo o que se pode caber nesses anos. até que não passem mais. até que eu não precise, olhos cheios de lágrimas, escrever mais um texto sobre o meu aniversário.
afinal, ela me disse, quando eu disse estar ficando velho, quase trinta anos, ela me disse que ainda faltam quatro anos para os meus trinta, o grande marco - se eu chegar lá - mas ela me disse que falta muito e continuou perguntando aonde eu estava há quatro anos e a reticência que se seguiu em mim fechou a sentença a me dispunha cumprir: eu não me lembro, talvez não queira lembrar, ia tudo muito bem há quatro anos, como era tudo uma merda há quatro anos, exatamente como hoje também é; dessa forma, daqui a quatro anos, quem sabe: eu vivo hoje.
eu vivo hoje como programa de abstinência de viciadinho em narcóticos, mas eu vivo. vivi ontem e antes de ontem e tenho estado vivo há uma semana, mas a vontade de deixar de viver ou voltar a morrer em doses de um grama ainda me seduz de maneira tamanha! mas não falemos disso, hoje é meu aniversário. falemos de coisas boas.
meu presente de aniversário: viagem a porto alegre, rever a família, os irmãos que a
natureza jamais poderia me ter dado, mas que me deu o acaso, somos então e somos só e somos sós - mas por escolha! e eles me reviram e sorriram aquele sorriso de esperança ainda, quando eu digo que não há mais por onde e o que resta é dançar um tango argentino ou encarnar o junkie americanóide e morrer aos vinte e sete, mas os sorrisos, ah, os sorrisos me comovem e me demovem de toda autodestruição, porque não poderia deixar de tê-los, de vê-los sorrindo pra mim, por mim.
há quem não telefonará hoje. roni, charles, daniel e quantas pessoas que não fazem mais aniversário e nesse momento eu penso na crença dos que crêem e lamento não tê-la. penso revoltado que não poderei receber um telefonema ou um postal dos que não andam mais por aqui. simplesmente porque não existem mais. e porque céu não há, está claro.
a comoção de um cumprimento de meu pai, um aperto de mão que transformo em abraço e em beijo e em mais um abraço. gabriel que me dará um embrulho e pensará, criança que é, na injustiça de não receber ele um presente. o presente mais bonito: um abraço de criança.
se eu esperava sentado na calçada pelos que viriam, não espero. se há um ano escrevi o texto de aniversário que escrevi, era porque esperava. não espero mais. não espero mais nada. deixarei que os anos venham; eu sobrevivo. deixarei que os anos venham e tragam consigo tudo o que se pode caber nesses anos. até que não passem mais. até que eu não precise, olhos cheios de lágrimas, escrever mais um texto sobre o meu aniversário.
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