29 de nov. de 2017

numas das tentativas de me aproximar de meu pai e seus silêncios, aceitei seu convite para passar a noite em seu trabalho. na época, ele era vigilante num hospital infantil aqui em blumenau. turno de 12 horas, folga de 36. não lembro a idade, se 13 ou 14, mas fui. o lugar, o hospital, estava vazio, embora atendesse emergências. eu ainda não fumava e não entendia de silêncios, e isso me distanciava do pai.

a televisão ligada, o café esfriando lentamente na garrafa térmica. chegou um carro da polícia. fui me acercando até conversar com os policiais. eles me mostraram armas, falei que o pai trabalhava de vigilante - e que vigilante é um tipo de polícia. perguntaram o que eu queria ser quando crescer. não lembro minha resposta.

não sei porque, mas lembrei desse dia depois de atender dois irmãos aqui no trabalho. um deles, analfabeto. na hora de assinar a documentação, precisou do RG para copiar a assinatura. o outro, porém, tem uma assinatura de letras arredondadas, letra cursiva, lembrei da minha.

lembrei do pai, de como não lembro de sua letra. deve ser arredondada, imagino. por ser anterior à minha, devo copiá-la de alguma forma. lembrei de quando era guri e as pessoas me perguntavam o que eu queria ser: não lembro as respostas. talvez não saiba até hoje. talvez nunca venha a descobrir.

de manhã, pelas 6 horas, largamos o turno. eu estava bêbado de sono. naquela época, as madrugadas não passavam tão rápido como hoje. hoje, às 8:30, eu me deparo com essas assinaturas tão diferentes. penso: eu tenho uma assinatura, pai. eu tenho até uns livros. mas eu não tenho uma profissão. sempre exigiram de mim que eu me apartasse do simples.

se eu fosse vigilante, pelo menos as madrugadas me fariam companhia.

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