para a Amanda Vital e para o Caio Augusto Leite
nós nunca perdemos tardes inteiras
de domingo assistindo arquivo-x
pensando o que houve de tão importante
nos noventa - se os ternos com ombreiras
se os telefones com fio se os cabelos com
laquê - e nunca passamos tardes inteiras
mostrando-nos fotos de família identificando
aqui meu pai aqui minha mãe aqui aquele
cachorro de estimação. nós nunca abrimos
fizemos suco em pó numa garrafa vazia
de coca-cola e nunca mas nunca mesmo
discutimos a morte de tancredo ou sarney
e a semana do presidente - pela primeira
vez na televisão, dizia o narrador anunciando
um filme que já nascera antigo - e nunca
assistimos juntos ao carnaval de rua de
florianópolis, belo horizonte, são paulo
no entanto
este poema não é um inventário de desfeitos
não é um itinerário de descaminhos não é
um agendamento de impossibilidades não
é um despedir-se, pelo contrário: é sobre
um abraço que ainda está por vir
desajeitado porque triplo porque tímido
- são os abraços que nos apresentam, não
os sorrisos, são os abraços que nos esquentam -
e porque o amor cisma e porque o coração
aguenta ler amanda logo cedo ler caio no olhar
derradeiro que antecede o sono e sonhar com
um texto escrito e vivido e verdadeiro um
poema que termine dizendo
meus amores, as janelas estão abertas
para o vento entrar
e não para nos atirarmos por elas.
para o vento entrar
e não para nos atirarmos por elas.
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