18 de ago. de 2009

Setembro.

eu tinha quantos anos e quantas vezes vou escrever sobre isso, mas fazia sol e viriam as pessoas viriam, mas elas não vinham e havia bolo e refrigerante e talvez chapeuzinhos, havia balões, sempre houve balões que eram enchidos para serem esvaziados com o tempo, a tristeza que é um balão esvaziando, sinal de que não foi estourado na festa porque não houve festa.

as pessoas viriam, as pessoas viriam e eu esperava sentado na calçada olhando a estrada, elas fariam uma curva à direita e eu reconheceria os carros, é para isso que são feitos convites e é por isso que se sonha na noite anterior com os presentes que a gente vai ganhar, acho que por essa época eu sonhava com um forte apache ou era mais tarde e já havia o comando cobra, embora eu sempre jogasse do lado dos mocinhos.

sempre houve essa angústia pelas pessoas que viriam e depois de horas e horas e horas as pessoas iam embora arrotando salgadinhos e refrigerante de laranja e eu continuava esperando as pessoas que viriam, não estava mais sentado na calçada, estava com caganeira de tanto brigadeiro enfiado güela abaixo, de tanto bolo de morango, cagando e esperando ainda as pessoas que viriam que iam embora naquele momento, que estiveram ali e nunca vieram.

as pessoas então viriam e eu sempre esperei angustiado como ontem ainda, não ontem, é figurativo, ontem eu sorria conversando com ela, ontem outro ontem, pra não especificar, ontem eu escrevia a maria, escrevia à maninha, escrevi há muitos anos ao meu pai e meu irmão tem um poema só pra ele, e eles nunca leram, nunca leram e eu digo pra não reparar, outro dia disse pra minha irmã não te angustia se ler, não leu, óbvio, mas o texto era para ela em sinal do repúdio e amor que somente família pode proporcionar.

por isso hoje o estômago revirado, náusea, náusea, esperando pra vomitar tantos quilos de salgadinhos, tantos litros de coca cola que me enfiaram sem eu poder decidir se era isso ou se era um abraço, um carinho mais de perto no colo de quem, talvez que tenham morrido alguns dos que vinham ou simplesmente desapareceram, o que também é uma forma de morrer.

dez anos atrás ou nove, não sei precisar, acordei antes da hora, saí do quarto do internato e pedro fazia qualquer enfeite na minha porta com papel higiênico e era para ser bonito e eu me puni por ter aberto a porta cedo demais, e logo ganhei um abraço, pedro era um irmão mais novo. um ano depois chorei como criança por não poder passar o último aniversário feliz da minha vida com quem realmente se importava com ele, pedro, dover, edo, gerber, aonde andarão essas pessoas que tanto amo.

as pessoas que viriam nunca vieram, estavam lá e nunca vieram, quanto tempo faz e quantas vezes escreverei sobre isso. o colo de meu pai, meu irmão não apareceu ou chegou tarde e minha irmã. chorei ao apagar as velas, tem foto disso, ainda não sabia, o pai me segurando no colo. hoje chamo de inferno astral o que é só tristeza e lá se vão tantos anos e quantos mais virão e a sombra de setembro chegando será sempre punição. porque quanto mais desejos a serem realizados, menos pedidos há a serem feitos.

vai ser diferente, agora. ela vai me escrever e eu vou sorrir chorando por estar tão longe. em setembro os ipês florescem e a saudade é uma flor amarela que mastigo sem pensar.

11 comentários:

Tati P. disse...

e eu já tô quase chorando agora e faltam tantos dias! e eu vou chorar querendo tanto dar um abraço nesse dia, e ainda depois de ler tudo isso, a vontade fica ainda maior.

Anônimo disse...

Belo estilo.

Padma Shanti disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Padma Shanti disse...
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Padma Shanti disse...

Lindo.
Receba aí um carinhoso abraço meu pelo inferno astral.
beijo.

Ras disse...

muito bom Seu Labes,as magoas vem de quem esperamos carinho,as familias são campeãs,muito bom mesmo cara,deu pra ver o alemãozinho sentado na calçada....

Anônimo disse...

É isso que eu queria ler. Um estilo fantástico. uma leitura angustiante, mas simples.
Vezououtra tu vens com um desses que balançam as bases.
isso é literatura.

Cláudia I, Vetter disse...

eu chorei muito me vendo aqui. vendo o peito aberto nas palavras cruas e lentas de alento.

e eu não acreditei no final.
tu leu meus pensamentos falando do entremeio fatal da minha vida.
os ipês... os ipês...

são mesmo a metáfora mais profunda e ingrata.

Marcelo Labes disse...

agradeço a todos pelas leituras atenciosas. abraço.

Rodrigo Oliveira disse...

bah, mais um pancadão. visceral novamente, com aquele twist de labes que faz a gente fazer careta.

Unknown disse...

parafraseando Cateano, é Lindo! rsrs
Texto que toca a ferida da gente.
Me fez lembrar minhas próprias angustias de aniversário,
Cada ano uma incerteza, muitas decepções, mas resta a esperança do ano seguinte... vai ser diferente...por isso, voltamos a sorrir... sorrir é preciso (outra paráfrase)

já ia avançado o dezembro naquele dois mil e hum já ia também naque le dois mil e vinte os dezembros se mpre têm disso: são somas de térm in...