27 de out. de 2009

O meu nome.

perguntei uma vez sobre os nomes, esses nomes, marcos, ligia, marcelo e a resposta foi tão bonita, marcos e lígia vieram do quo vadis?, dos tempos de colégio sagrada família, quando mamãe lia ainda alguma coisa que não fosse cristianismo barato. e marcelo, bem, marcelo veio, assim, era moda, não soube dizer a novela da época, decerto que havia um desses.

mamãe outro dia disse não haver um labes que preste, vejam só, lígia uma vez foi lima, marcos tem em si vinicius, certamente que o nome vale, posto que são tanto, marcelo é só labes, os labes não prestam, papai falou cuida que não há labes que se salve, eu sei, o rosto vermelho de vergonha e pressão alta, os olhos vagos, o álcool. eu diria: não tenho necessidade de beber, mas de provar que não tenho necessidade, logo bebo pra mostrar que não preciso; ninguém entenderia, talvez nem eu.

labes é uma incógnita desvendada, eu disse com entusiasmo NÃO SOU ALEMÃO, ninguém riu, sou francês excomungado, pastorzinho luterano de merda brigou com o rei católico francês, disse vai embora, e ele disse eu vou, foi pra alemanha. essa tristeza, essa melancolia de imigrante faminto, imigrante fedendo a merda de anos e anos a fio remoendo a certeza que na europa era melhor, eu nunca fui à europa mas a tristeza parece ser a mesma. acontece que se isso aconteceu no século dezesseis e há mais de quinhentos anos o pastorzinho fiel a nosso senhor jesus cristo e independente do poderio de roma mudou-se pra alemanha, não adianta esconder que, sim, eu lamento, ich bin deutsch, honey, e nada posso fazer contra isso.

dissoa, contrasta, fere meus ouvidos, talvez que haja um ponto da língua que prende, os dentes são tão bonitos, tão bonitos, dizia doutora rosa, a dentista que me dava mais atenção do que qualquer mulher jamais me daria, eu não fumava. enfim, deve ser uma questão de língua nos dentes o soar feio desse encontro de r com c com elo mar-ce-lo, ligia me chama de mar e eu olho o mar e penso no quanto há de distância semântica entre nós.

se eu fosse menina, devia ter sido, teria outro nome, seria estéfani, stephany, nie ou qualquer coisa que o valha, marcelo não soa ruim, poderia ser rafael, talvez tenha sido, há quem diga que tenho cara, rafael pelo menos é nome de anjo, será?, marcelo é o diminutivo de marcos, sempre dou o exemplo, ânus é anel, anelus é anelzinho, marcos é martelo, marcelo é isso aqui, o latim é que explica.

marcelo labes, esse aqui, isso aqui, acabou esse espaço de escrever, tentar outra coisa, falar da vida alheia novamente, escrever poeminhas novamente, lançar livro, beber livros vendidos, encontrar nova forma de presentear as pessoas, eu não sei dar presentes, o livro pelo menos ajuda, não vou repetir, podia mudar a dedicatória, melhor outro livro então.

talvez que algum filho, se filhos houver, um filho de um amigo, um sobrinho, bem mais provável, um dia pergunte ao então carcomido do que tu te lembras? e eu direi, sinceramente, pensei hoje tão claramente - como quando deus morreu, foi simples, bonito, colorido como é para quem não tem daltonismo, olhei e disse não há deus e nunca mais houve. assim simples eu pensei nos domingos de manhã, o abrir dos olhos, a tontura, sempre a náusea e a mão fria da ressaca sobre meus olhos, nunca mais faço isso, nunca mais me torturo, cansei do estrago, larguei essa vida, o que eu disse?, o que eu fiz? eu direi a quem perguntar do que tu te lembras? eu direi, simplesmente:

eu me lembro de ter esquecido.

5 comentários:

Anônimo disse...

eu gosto deste estilo. meio cronica, meio desabafo.

Rodrigo Oliveira disse...

mais um belo texto. Essa nova fase em primeira pessoa, está rendendo bons trabalhos, apesar de eu gostar muito daquelas terceiras que, parecem, ficaram para trás. Ainda assim, ao ler isso, lembro do Saramago, e os seus nomes. E lembro, que não importa em que pessoa, o papel só recebe personagens. Deles, por mais que queiras, não escapas. Disso não te esqueças.

Marcelo Labes disse...

as terceiras não sumiram - tomaram férias. e isto de escrever de mim ou de qualquer, quem sabe? personagem é quem vive ou quem sobrevive pra contar? tão bom te ter aqui, rodrigo! tão sério, tão antiesquecimento! não esqueço: "eu sou o que sou, pois eu vivo da minha maneira", como diria o ébrio. sigamos. lisonja minha ter-te leitor. eu sorrio!

Marcelo Labes disse...

"o papel só recebe personagens" foi a frase que há muito tenho querido e só agora compensa - por merecimento, seja qual for o seu valor -, inevitavelmente ler.

Rodrigo Oliveira disse...

Sorrimos ambos então. Tô sempre por aqui e, volta e meia, não sei bem porque, tb lá no Falações. Lembra? Provoco, sim. Porque ele me provocou primeiro. E se o personagem é quem vive ou quem sobrevive pra contar... bah, difícil isso. Vou deixar martelar (por martelinho)isso aqui na cabeça. Quem sabe uma hora apareça uma solução. Ou uma trinca.

já ia avançado o dezembro naquele dois mil e hum já ia também naque le dois mil e vinte os dezembros se mpre têm disso: são somas de térm in...