3 de out. de 2016

Da casa da infância restaram

a televisão telefunken colorida
que criava horror sempre que anunciava
imagens do Exorcista, esverdeadas
a voz de penumbra que anunciava
"pela primeira vez na televisão";

o carpete verde-desbotado
logo substituído por um marrom-quase-gasto
colado imediatamente em cima do anterior;

poeira nos móveis
óleo de peroba
dedo na tomada
cheiro de asfalto;

num disco trilha sonora de Amadeus
a faixa mais emocionante
mesmo até que a Flauta Mágica
era sem dúvida traição
do medíocre Salieri, pobre Wolfgang
morreu de remorso e tosse
mas ainda me emocionava
(como até hoje, confesso)
e posso dizer que da infância
restaram o carpete verde,
Mozart e Salieri
que seria dizer epifania e traição
culpa e adoração
italiano e alemão
e pra tudo isso meu reverberante
foda-se.

E, claro, as árvores cortadas
ameixeira
amoreira
goiabeira
palmiteiro
acerola
e o ipê amarelo
que de tão triste essa história
não vale a pena
agora
recordar.

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