11 de nov. de 2015
Poema de(sa)finados
dia três
e a vida continua:
cada vez mais vida,
cada vez mais crua.
dia três e as flores
estão nuas.
ontem paramos
[não paramos]
lembrando nossos
mortos.
hoje, saímos às ruas
sob chuva,
muita chuva.
e a vida continua
cada vez mais vida,
cada vez mais dura.
até que.
Poema-receita de bolo-estragado
uma receita de bolo
mais perversa do que
aquela descrita em ratos:
os amigos nunca mais vistos
nem nunca revisitados;
os livros não lidos
junto dos lidos e
nem um mais:
romances me deixam
quase esgotado;
olhar adiante - ou
quase um instante,
dá na mesma:
passado é passado
e nunca se sabe
se vai realmente
amanhecer;
pitadas de insônia
com cheiro de incenso
barato;
contatos, contatos,
e os abraços, cadê?;
eu durmo sorrindo
se sonho acordado;
a música inspira
pouco, um pouco mais
e cantaremos as mesmas
canções, aquelas canções
de quantos anos atrás;
eu choro baixinho com
propagandas de pai & filho,
fico lembrando aquela
antiga, de gelol;
se sustenido ou bemol,
já não estaremos mais vivos
quando o eclipse voltar,
quando o cometa passar,
quando finalmente o asteróide;
saudade existe em português
muito antes de a gente dizer
xará;
se café ou chá,
se chimarrão;
perdi muitos, já -
não encontrei mais
meu irmão;
faz tempo que choro
meu pai;
clóvis, quando se foi,
deixou mais dúvidas
que certezas,
mais perguntas
que desenhos,
só não deixou angústias,
que dessas já tenho
os bolsos cheios;
aquela nossa leveza era
bebida,
por isso os pés tão pesados,
por isso os bolsos furados,
por isso a gente não lembra
nunca se foi antes ou se foi
apenas no ano passado;
a gente nunca sabe realmente
de onde foi que a gente veio
e quando percebe, é cortado
pelo meio - alguma certeza
que se tinha, onde se vai
encontrar a essa hora da noite?;
há um poema debaixo de cada
travesseiro, não importa
qual seja o andar -
e se o elevador quebrar,
quais serão os monstros
que nos tomarão no colo?;
evite perguntas em poemas,
me disseram;
evite palavrões em poemas,
me aconselharam;
fale da vida como um todo,
não cite nomes nem datas,
faça um poema frio como a
bebida barata que engolimos
sem sentir o gosto.
o meu rosto, não reconheço,
mas sei exatamente em que
cantos escuros dessa cidade
escura chafurdei com a cara
na lama;
a cama hoje tá grande
e a ilha, e a ponte,
estão tão do lado de lá;
um poema mais perverso
do que ratos, eu queria
e não consegui escrever
nada que não coubesse
nesse dia.
mas diria ainda:
meu amigo,
fiz as pazes comigo
- e dum jeito bem
difícil de desacertar.
mais perversa do que
aquela descrita em ratos:
os amigos nunca mais vistos
nem nunca revisitados;
os livros não lidos
junto dos lidos e
nem um mais:
romances me deixam
quase esgotado;
olhar adiante - ou
quase um instante,
dá na mesma:
passado é passado
e nunca se sabe
se vai realmente
amanhecer;
pitadas de insônia
com cheiro de incenso
barato;
contatos, contatos,
e os abraços, cadê?;
eu durmo sorrindo
se sonho acordado;
a música inspira
pouco, um pouco mais
e cantaremos as mesmas
canções, aquelas canções
de quantos anos atrás;
eu choro baixinho com
propagandas de pai & filho,
fico lembrando aquela
antiga, de gelol;
se sustenido ou bemol,
já não estaremos mais vivos
quando o eclipse voltar,
quando o cometa passar,
quando finalmente o asteróide;
saudade existe em português
muito antes de a gente dizer
xará;
se café ou chá,
se chimarrão;
perdi muitos, já -
não encontrei mais
meu irmão;
faz tempo que choro
meu pai;
clóvis, quando se foi,
deixou mais dúvidas
que certezas,
mais perguntas
que desenhos,
só não deixou angústias,
que dessas já tenho
os bolsos cheios;
aquela nossa leveza era
bebida,
por isso os pés tão pesados,
por isso os bolsos furados,
por isso a gente não lembra
nunca se foi antes ou se foi
apenas no ano passado;
a gente nunca sabe realmente
de onde foi que a gente veio
e quando percebe, é cortado
pelo meio - alguma certeza
que se tinha, onde se vai
encontrar a essa hora da noite?;
há um poema debaixo de cada
travesseiro, não importa
qual seja o andar -
e se o elevador quebrar,
quais serão os monstros
que nos tomarão no colo?;
evite perguntas em poemas,
me disseram;
evite palavrões em poemas,
me aconselharam;
fale da vida como um todo,
não cite nomes nem datas,
faça um poema frio como a
bebida barata que engolimos
sem sentir o gosto.
o meu rosto, não reconheço,
mas sei exatamente em que
cantos escuros dessa cidade
escura chafurdei com a cara
na lama;
a cama hoje tá grande
e a ilha, e a ponte,
estão tão do lado de lá;
um poema mais perverso
do que ratos, eu queria
e não consegui escrever
nada que não coubesse
nesse dia.
mas diria ainda:
meu amigo,
fiz as pazes comigo
- e dum jeito bem
difícil de desacertar.
Se os poemas ao menos
nos dissessem o que
a gente cresce sem nem
desconfiar:
que a vida é dura
e é toda tua
e que não perdes
por esperar:
[a gente só perde
e senta, espera
perde, senta e
espera]
Se os poemas ao menos
dissessem que a gente
nunca chega, de fato,
a ganhar.
Então os poemas
seriam sinceros.
[E já não haveria
mais que escrevê-los].
nos dissessem o que
a gente cresce sem nem
desconfiar:
que a vida é dura
e é toda tua
e que não perdes
por esperar:
[a gente só perde
e senta, espera
perde, senta e
espera]
Se os poemas ao menos
dissessem que a gente
nunca chega, de fato,
a ganhar.
Então os poemas
seriam sinceros.
[E já não haveria
mais que escrevê-los].
Que o poema
fale por si.
Que os poemas
deem a si mesmos
algum significado.
Que os poemas nos
deixem dormir,
cada um prum lado.
Que os poemas nos
cobrem menos,
andamos tão atarefados.
Que não exijam demasiado,
que tenham em si a leveza
daquele dia em que eu sorria.
Por que poemas?,
volta e meia me perguntam.
(Eu me faço essa pergunta
todo dia).
fale por si.
Que os poemas
deem a si mesmos
algum significado.
Que os poemas nos
deixem dormir,
cada um prum lado.
Que os poemas nos
cobrem menos,
andamos tão atarefados.
Que não exijam demasiado,
que tenham em si a leveza
daquele dia em que eu sorria.
Por que poemas?,
volta e meia me perguntam.
(Eu me faço essa pergunta
todo dia).
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